sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

2o, Capítulo - minha história

Voltando ao foco principal de minha história, vale à pena situar o esquema de funcionamento das universidades brasileiras, tendo como referência a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
Naquela época não havia nenhuma cidade universitária nos moldes das que hoje em dia conhecemos. As unidades de ensino eram independentes uma das outras. Em Recife, por exemplo, a Escola de Engenharia ficava na Rua do Hospício separada de todas as outras unidades de ensino, sendo a mais próxima, a Escola de Direito. Contudo, praticamente todas situavam-se no centro ou próximas do centro da cidade. Por outro lado, praticamente todos os estados tinham cidades universitárias projetadas ou projetos iniciados e abandonados por falta de dinheiro.

A vida universitária, naquela época, era rica sob todos os pontos de vista. Ingressar na universidade não era brincadeira. Na Federal as vagas eram poucas e o candidato era submetido a provas escritas e orais. Não havia escolas particulares em cada esquina; que eu me lembre a Pontifícia Universidade Católica de Pernambuco (PUC/Pe) era a única alternativa à UFPE, e adotava mais ou menos as mesmas regras de admissão da Federal. Assim, a UFPE realizava o seu Vestibular e logo em seguida a PUC/Pe realizava o seu. Quem tinha dinheiro se submetia aos dois vestibulares. Além disso, havia também uma Escola de Medicina (a PUC não tinha curso médico) particular, e caríssima.

Eu comecei a freqüentar a Escola Federal de Engenharia no cursinho pré-vestibular ministrado na própria Escola, por obra e graça de um Convênio entre a Universidade e a SUDENE (Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste), hoje extinta. Eu fiz um concurso e, aprovada, fui admitida no cursinho da SUDENE. A SUDENE me pagaria um salário mínimo mensal durante todo o meu curso superior, se eu fosse aprovada no vestibular e mantivesse a média global mínima de 7,0 em todos os anos. Entretanto, essa entidade não tinha nenhum compromisso de me oferecer emprego nos seus quadros, ao término do curso. Isso foi muito bom. Pois, ao voltar para Recife, eu havia perdido a fonte de renda que eu tinha em Campina Grande. Eu dava aulas particulares de matemática a alunos e colegas em dificuldades.

O nível intelectual dos universitários da época era bastante elevado. Na escola de engenharia discutia-se, principalmente, filosofia e política. Quem não tivesse lido Marx, Hegel, e outros filósofos em voga na época, certamente ficaria bastante isolado. A atividade política da estudantada era intensa. Os Diretórios estudantis de cada unidade da universidade eram muito politizados.

Esse ambiente bastante “quente” da política universitária acompanhava a temperatura política do Brasil, com a sociedade dividida entre a “esquerda” (que defendia os movimentos de socialização e redução das diferenças sociais) e a “direita” que representava a parcela conservadora e avessa a mudanças, quaisquer que fossem essas mudanças. No resto do mundo, a “guerra fria” estava em alta.

Então, em março de 1964, veio o golpe de estado que derrubou o presidente eleito João Goulart.
O país estava em pé de guerra.
E eu caí inteira no caldeirão fervente.